Dois jornalistas vêm à minha cabeça quando penso na cobertura da morte de Ayrton Senna: Flávio Gomes, que pede demissão da Folha em meio ao caos instalado em Ímola, e Roberto Cabrini, o repórter que oficializaria, às 13h40 daquele 1º de maio de 1994, o óbito do tricampeão em um plantão histórico, que na primeira coleta do ibope em São Paulo acusara à Globo 30 pontos de audiência contra 8 do SBT, o dobro da média habitual da emissora, que já naquela época sofria nas mãos das gincanas de Gugu no "Domingo Legal".
Dar uma notícia do tamanho da morte de Ayrton Senna é como gravar um grande hit ou estrelar um seriado muito bom. Celine Dion nunca se livrou de "My Heart Will Go On". James Gandolfini morreu de mãos dadas com Tony Soprano. Flavio Gomes e Roberto Cabrini, cada um da sua forma, sempre serão perguntados sobre o fim de semana sangrento em San Marino. E é esse olhar pessoal, metalinguístico, o fio condutor do mais recente trabalho de Cabrini sobre o piloto: a reportagem "Trinta anos sem Senna", exibida pela Record no último "Domingo Espetacular".
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O "show & tell" de Cabrini é bem temperado. Em Ímola, o jornalista passa pelo muro da Tamburello, pela torre de controle do circuito e pela sala de imprensa do Hospital Maggiore, em Bologna. No Brasil, vai à casa de Galvão Bueno, melhor amigo de Ayrton, para que ele reagisse ao "Senna bateu forte". A emoção do narrador é, de alguma forma, um espelho do sentimento dos milhões de brasileiros que assistiam ao vivo à batida fatal. É uma abordagem diferente da observada no documentário de Galvão no Globoplay. E bastante rica.
Ninguém na TV cobriu a morte de Senna e suas consequências com tanto afinco quanto Roberto Cabrini. "A notícia que a gente nunca gostaria de dar" é e sempre será a notícia mais presente de sua carreira. Poder vê-lo em Ímola, repetindo os passos de trinta anos atrás, é um privilégio. É a oportunidade de ver a história em making-of.