Maniqueísmo pobre e engajamento de fachada suportaram "A Força do Querer"

Com quase 36 pontos de média em São Paulo, "A Força do Querer" marca a recuperação da Globo no horário nobre e o poder de duas armas esquecidas pelo departamento de dramaturgia da emissora: o maniqueísmo ginasial e o merchandising social.

Para promover o universo trans e combater o preconceito, causas que cativam as pessoas que picham prédios da Globo e obrigam seus repórteres a cobrir protestos com microfones sem canopla, Glória Perez criou vilões bitolados, personagens de apoio rasos e vítimas estereotipadas. A sociedade não discutiu o tema, apenas assistiu, com todos os vícios de linguagem do finado Telecurso 2000, uma aula arrastada sobre tolerância.

O falso engajamento social, festejado por ONGs e aqueles seis ou sete especialistas em comunicação que nunca ligam a TV, é ótimo para a imagem da Globo, mas não planifica a compreensão do público sobre os transgêneros. Muitos paulistanos assistiram à novela porque Record e SBT passaram quase seis meses fora da TV a cabo. O hiato abriu caminho para a recuperação dos pontos perdidos para "Carinha de Anjo", "Chiquititas" e "O Rico e o Lázaro".

A recuperação do público não é consequência exclusiva da arrastada negociação entre NET, Claro, SBT, Record e RedeTV!. Glória Perez é a melhor autora de folhetins tradicionais da TV brasileira. Os antagonismos são criados logo nos primeiros capítulos, permitindo o envolvimento do telespectador com os personagens e seus objetivos. É estruturalmente pobre, mas a eficácia é inquestionável. Se "Babilônia", em 2015, tivesse seguido o mesmo caminho, Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg trocariam beijos até o último capítulo. 

É necessário talento até nas piores novelas.