Fim do BuzzFeed News amplia leque de dúvidas sobre futuro do jornalismo digital
Nem o BuzzFeed Brasil, símbolo da internet efêmera e memética das redes sociais, conseguiu sobreviver. A operação jornalística do portal de entretenimento disse adeus na última segunda-feira, sem cerimônias. Graciliano Rocha, editor-chefe do site, atribuiu a decisão à crise financeira engendrada pela pandemia do novo coronavírus. Ainda que a influência da crise sanitária seja inquestionável, a bancarrota do BuzzFeed News Brasil verbaliza problemas mais profundos, quiçá estruturais, que envolvem todos os players do mercado.
A discussão sobre a monetização do jornalismo digital belisca o início deste século. Na era pré-Facebook, os blogs despontavam como sucessores da velha imprensa. Na cabeça dos especialistas, os leitores, com o passar dos anos, trocariam os jornalões por jornalistas, remunerando individualmente suas fontes de informação. Se levarmos em conta a profusão de sites de pequeno, médio e grande porte que recorrem a plataformas de financiamento coletivo para sobreviver, algo de fato aconteceu nessa direção. Se colocarmos no papel a arrecadação desses canais e traçarmos um paralelo com os custos operacionais, a esta altura multiplicados por 6, a imagem que surge é a dos músicos do "Titanic", prontos para o número final.
Os brasileiros têm alergia a conteúdo pago na internet. Das notícias da Folha de São Paulo aos filmes eróticos da produtora Brasileirinhas, quem barganha moedinhas fica a ver navios. É um comportamento enraizado e ecoado, em parte, por outros povos da América Latina. O xis da questão é que é possível sobreviver sem a Brazzers. Sem jornalismo de qualidade, não.
A imprensa é o esteio da democracia. São os publishers independentes que fiscalizam os poderosos e azeitam as instituições para tudo correr dentro dos conformes. Países que cerceiam a liberdade da atividade jornalística ou dão de ombros para a mesma são invariavelmente sujeitos a caprichos totalitários. Hoje, o Brasil tem poucas redações ativas. A franca maioria sobrevive graças ao hábito dos leitores offline, que pagam as assinaturas mais caras e dão volume aos informes do IVC. O business online cresce, mas a duras penas e leves cotas: o remédio milagroso que enxuga 18 cm de gordura abdominal em três semanas é um mau anunciante. E R$ 9,90 de cobrança digital é pouco, muito pouco, para manter uma redação numerosa e qualificada.
A ruína da imprensa privada inebria o único ente que ainda investe em informação: o governo. Bolsonaro prometeu acabar com a EBC, mas mudou de ideia ao constatar que nossos portais publicam qualquer abobrinha da Agência Brasil. Os releases estatais somados aos testemunhos atrapalhados do presidente da República – o debatedor do "Superpop" sabe atrair atenção, convenhamos – frases desastradas do clã permitem ao Palácio do Planalto um formidável controle sobre o que é repercutido fora das dependências da Globo. Os veículos privados alinhados com o governo passam quase desapercebidos.
Esvaziado pelas redes sociais, podado pelo Google, que domina o investimento publicitário na internet, e abandonado pelos leitores, o jornalismo brasileiro está por um fio.