A Folha não veste amarelo quando quer cliques

Meses atrás, a Folha produziu um videoclipe para defender a democracia. A gravação, um tanto constrangedora, mescla versinhos ginasiais – “Amarelo/ A cor que já te fez votar/ Agora vai ter que voltar” – e caras e bocas de jornalistas e artistas com peças amarelas. O maior atentado às liberdades desde o golpe militar de 1964.

Aparecer na TV para apoiar a democracia é a obrigação de todo veículo de comunicação. Não há business sem liberdade. Acontece que a Folha é um tanto esclerosada quando o assunto é liberdade. Para o pessoal da redação, o antídoto contra o radicalismo é a pluralidade. É uma lógica estúpida, que ignora uma reação elementar: o extremismo de direita é rival do extremismo de esquerda, não da social democracia ou das novas e moderadas lideranças que surgem por aí.

Nesta quarta-feira, a Folha veiculou uma entrevista com Jones Manoel. Popular no Twitter, que é a TV Gazeta das redes sociais, o marxista disse que Stálin não era a reencarnação de Lúcifer, deu parabéns ao regime soviético por não se esquecer de construir casas e creches enquanto reprimia violentamente a população e justificou os fuzilamentos comandados por Che Guevara.

"O Che Guevara, uma das melhores figuras que já passaram pela história da América Latina, foi, sim, responsável por alguns processos de fuzilamento. Nada comparável que qualquer presidente dos EUA fez. E foram movimentos essencialmente defensivos", sugeriu.

O que a democracia e o debate público podem extrair disso? Eu respondo: nada. O stalinismo é tão espúrio quanto o terraplanismo e o movimento antivacina. Quem revira o lixo da internet para promover esses assuntos é tão irresponsável quanto os pobres coitados que iniciaram o acidente do césio-137. A diferença é que os goianos não sabiam que estavam lidando com material radioativo. Os jornalistas, pela formação que possuem, sabem.

A função da imprensa não é reverberar bobagens, ainda que elas rendam audiência. É filtrar bobagens. Nem tudo pode ou merece ser repercutido. Quando as empresas de comunicação deixam de cumprir seu papel e aceitam ser meras repetidoras, o filtro vai pelos ares, escancarando o caminho para os influenciadores de ocasião.

Não existe amarelo que mude isso.