"Qual o maior anti-herói da TV? Don Draper, Walter White ou Tony Soprano?"
A pergunta que a imprensa brasileira mais repetiu nas últimas semanas é a maior manifestação de desmerecimento que "Mad Men" poderia receber.
Criador da série, Matthew Weiner não é um novato. Nem um noveleiro. Como explicou ao "The New York Times", em entrevista traduzida e publicada por "O Globo", cria suas histórias - e os últimos capítulos - com a impressão de que não deve nada a ninguém. Porque o público é imprevisível. E os personagens devem seguir esse comportamento errático.
Don Draper não é um novo Tony Soprano. Nem poderia ser. Tony enfrentava problemas psicológicos, mas não era covarde. Tampouco dedicava tempo para refletir sobre as consequências de seus arroubos. Ou a eficácia de suas ideias. Christopher Moltisanti, seu sobrinho, teve a pena de morte decretada pelos versos "the child is grown, the dream is gone", de "Comfortably Numb". É o eu-lírico mais doentio e perturbado que se tem notícia.
Richard "Dick" Whitman é o inverso. Sem o tratamento que julgava merecer quando criança, só conseguiu reagir na Guerra da Coreia, quando matou, por acidente, o verdadeiro Draper. Frangote covarde, o inventor de slogans criava ali a extensão de seu pior produto.
Apesar da altivez, o publicitário exala fraqueza em cada um dos 91 episódios - o 92º vai ao ar esta noite na AMC e amanhã na HBO. As muitas mulheres conquistadas por ele não revelam falta de caráter ou descontrole sexual. Elas exemplificam sua falta de identidade, unidade. Defeito complexo demais para ser corrigido trocando o nome do produto.
O flerte com o suicídio é outro elemento fundamental da compreensão do protagonismo covarde. Ao instruir Lane Pryce a pedir demissão da agência, no quinto ano, sabia que seu sócio desistiria não apenas dos Estados Unidos, mas da vida. Até as peças do hotel escolhido na passagem pelo Havaí abordavam a desistência como solução para algo que, na cabeça dele, nunca existiu realmente.
Não existe herói sem nome, caráter e coragem. Mas agora existe um grande personagem com essas características. Para pensarmos sobre nossas verdades. E, especialmente, nossas mentiras.