A última grande novela do Brasil --falo de qualidade, não de repercussão-- começa e acaba em 1995. "A Próxima Vítima" era ousada sem ser erudita e popular sem ser hedionda. Havia crime, comédia, romance, suspense, mistério, drogas, traição, sexo e bons debates sociais. Tudo muitíssimo bem embalado por um inspirado Silvio de Abreu, o novelista mais versátil do Brasil, e ciceroneado por uma vilã que não era vilã.
Filomena Ferreto, interpretada por Aracy Balabanian, era rude, gélida, manipuladora e vil ao mesmo tempo em que era carente, reprimida, corna e ingênua. Marcelo, seu cunhado, era o lobo em pele de cordeiro. Isabella, sua sobrinha, só tinha olhos para a mansão e as posses da "titia". Eliseu, seu esposo, era o Neymar de Higienópolis. E "ventre seco" era o predicado que ela mais ouvia das irmãs, menos ricas, porém mais felizes do que ela.
À medida que "A Próxima Vítima", disponível hoje no Globoplay, se desenvolvia, ficava mais claro para o público que os tapas na cara e os gritos de "inútil" de Filomena eram pueris, ocos, parte de um cerimonial idealizado por ela para esconder a pequenez de sua alma e a infelicidade de seu coração. É mais que a humilhação pela humilhação, praticada por Odete Roitman tantas vezes em "Vale Tudo". É a humilhação como instrumento de proteção, digna de perdão e até admiração.
Aracy Balabanian, admirada pelos brilhantes trabalhos cômicos, fez história na TV com uma vilã forte e triste. Uma vilã que era caça e caçadora. E em plena faixa nobre da Globo. Se não ela, quem mais poderia ser esta perfeita Filomena Ferreto? Ninguém.