O transgressor Pantera Negra

"Pantera Negra" conseguiu. Conquistou a quinta maior estreia (US$ 201,7 milhões) da história dos Estados Unidos, atrás apenas de "Star Wars: O Despertar da Força", "Star Wars: Os Últimos Jedi", "Jurassic World" e "Os Vingadores". "Mulher Maravilha", outro exemplo de fenômeno cultural, sucesso de crítica e de bilheteria (e que atraiu um público ignorado por muito tempo) estreou na marca dos US$ 103 milhões e chegou aos US$ 412 milhões somente nos cinemas americanos. O potencial de "Pantera Negra", portanto, é magnífico.

Por que a bilheteria de "Pantera Negra" importa? Porque, por muito tempo, filmes com elencos negros foram considerados como algo de nicho, que não traziam lucro, uma espécie de “filme c”. Em tese, não era racismo. A desculpa para não fazer um filme como "Pantera Negra" – uma superprodução, com elenco e equipe de negros, contando uma história negra – era a de que o público-alvo dos blockbusters é composto por jovens homens brancos, e que era preciso agradá-los. Não mais.

Não foi fácil, é claro. Antes mesmo da estreia, um grupo no Facebook combinou de sabotar as críticas do filme no site Rotten Tomatoes. O mesmo grupo, que se declarou “alt-right”, se disse responsável pelos ataques a "Star Wars: Os Últimos Jedi", pois ficaram insatisfeitos com a quantidade “excessiva" de personagens femininos. No dia da estreia, trolls espalharam fotos falsas de pessoas brancas que teriam apanhado por tentar assistir "Pantera Negra". A polícia de Los Angeles disse ao The Hollywood Report que não recebeu chamada alguma a respeito.

Qualquer um que menospreze a importância cultural de "Pantera Negra", portanto, é um imbecil. Ok, mas e o filme?

Dirigido por Ryan Coogler ("Creed: Nascido Para Lutar"), "Pantera Negra" conta a história do Príncipe T’Challa (Chadwick Boseman), que retorna a Wakanda para se tornar rei. Wakanda é um paraíso tecnológico, escondido do resto do mundo, graças ao vibranium, um metal super poderoso – matéria-prima do escudo do Capitão América – que desperta a cobiça de Ulysses Klaue (Andy Serkis) e pode ameaçar a paz de todo o país. Um dos sócios de Klaue é Erik Killmonger (Michael B. Jordan), que tem motivos pessoais para prejudicar T’Challa. Esta é a trama principal, mas são as mulheres de "Pantera Negra" que fazem o filme: Lupita Nyong’o como a agente Nakia, Danai Gurira como a General Okoye e Letitia Wright como a genial Shuri, sem falar de Angela Basset como a Rainha Ramonda. São quatro personagens femininas fortes, bem concebidas, com personalidades distintas e que mudam o curso da história.

A ação é o único departamento que o filme deixa a desejar. Com direção de fotografia assinada por Rachel Morrison, primeira mulher indicada ao Oscar de Melhor Fotografia ("Mudbound"), a câmera parece muito frontal e muito próxima durante as cenas de luta, dificultando a compreensão do que está acontecendo. As cenas do pôr-do-sol de Wakanda e do reencontro de T’Challa com seu pai, porém, são mesmo lindíssimas, e justificam o ingresso em Imax 3D. A direção de arte e o figurino também enchem os olhos. A trilha de Kendrick Lamar dá vontade de mexer os pés.

Outro fator positivo de "Pantera Negra" é que o roteiro não se preocupa muito em deixar brechas para sequências ou outras franquias, mas apenas em contar a história de T’Challa e Wakanda. "Pantera Negra", assim, segue a tendência de "Logan" e "Mulher Maravilha", filmes que se concentraram em contar uma história sólida e com personagens bem pensados – e o público correspondeu de acordo.