por Eduardo Conti
Black Mirror faz sucesso saciando a sede de diferenciação do público jovem através de críticas à sociedade contemporânea.
A série inglesa, que já conta com três temporadas disponíveis no Netflix, exibe histórias autônomas a cada episódio, tendo como fio condutor a crítica social às agruras da sociedade contemporânea, sobretudo no que diz respeito aos impactos negativos da tecnologia e da internet sobre as relações interpessoais.
Da alienação midiática à vaidade alimentada por likes nas redes sociais, os roteiros da série assumem perspectivas ora satíricas, ora sombrias da era digital, mas sempre com o firme propósito de colocá-la em cheque.
Malgrado tal premissa já tenha sido repetidamente explorada por vários outros sucessos cult da última década (por exemplo, Fight Club, Requiem for a Dream, Trainspotting e tantos outros), o fascínio que o conceito de “tapa na cara da sociedade” exerce sobre o público, especialmente o jovem, parece não se esgotar.
Talvez a explicação do fenômeno resida no fato de que, se com uma mão o roteirista desfere esse tapa, com a outra ele lustra carinhosamente o ego do espectador, fazendo-o crer que a reles capacidade de entender a mensagem transmitida seria suficiente para destacá-lo da realidade criticada. Com isso, supre-se a necessidade de diferenciação típica dos primeiros anos da juventude, época em que tendemos a formar nossa individualidade muito mais com base na negação daquilo que reputamos ser o status quo do que por exercício de verdadeira autonomia.
Embutida na mensagem central de rejeição à contemporaneidade, Black Mirror oferece ao espectador uma auto-elogiosa sensação de não pertencimento à massa criticada, o suficiente para que ele se sinta à vontade para exibir a superioridade espiritual alcançada mesmo nas redes sociais, atitude que não pode ser explicada por outra coisa que não a vaidade (ser percebido como pessoa mais senciente ou mais inteligente do que a média) e a vontade de ser aceito (pelos demais iniciados na arte de desconstruir o modelo social vigente) – vejam só – as mesmíssimas chagas indissociáveis da condição humana que a série se propõe a denunciar.