A Odete Roitman 'woke' do remake de "Vale Tudo"
O remake de "Vale Tudo" não tem data de estreia, mas já está sepultado. Manuela Dias, autora da atualização do clássico de Gilberto Braga, apresentou o atestado de óbito na Folha desta segunda-feira (14).
"'Vale Tudo' foi a novela da volta da democracia, e naquele momento falar mal do Brasil, ou poder falar mal, era resistência, era revolucionário, era novo. Hoje não é mais. A gente está saturado disso. O novo é encontrar maneiras de transformação. Odete não aponta caminhos, mas será diferente. Não só ela. Torcíamos para Heleninha beber, dançar e quebrar tudo. Hoje, sabendo que ela é uma doente, vamos torcer?", ameaçou.
"Como jornalista que também sou, me dá medo dizer que 'Vale Tudo' vai ser construtivo. Não vai. Agora, perto da novela original, será. Apontar defeitos do Brasil era uma subversão. Não é mais. Não é sobre o que é construtivo ou depreciativo. É sobre o que é subversivo. Com essa postura hipercrítica, Gilberto estava mostrando a cara do Brasil naquele momento. Mas a cara do Brasil mudou, então ela não faz mais sentido", sabotou.
"Vale Tudo" não era exatamente a novela da volta da democracia. "Vale Tudo" era a novela do "vamos mandar essa gente pro inferno". Odete Roitman não era resistente, revolucionária ou nova. Ela era um João Romão de saia e bolsa Hermès. Brega, pobre de espírito e cheia de vícios, tinha a qualidade de jamais reconhecer uma autoridade moral pela frente. Odete era necessária --como é necessário espinafrar o Brasil, seja na internet ou na TV, todos os minutos do dia.
É triste ler que "perto da novela original" o remake de "Vale Tudo" terá um espírito "construtivo". Gilberto Braga jamais faria o sucesso que fez se tivesse trocado a vilania pré-Televisa pelo afeto de programa eleitoral. "Vale Tudo" original era uma novelaça pelo caráter destrutivo, pela falta de sutileza, pelo mercenarismo cruento de seus personagens. Na hora em que o Brasil mais precisa se aproximar dessa gentinha, vem alguém para colocar tudo na lata do lixo em nome de um bem que nem existe.
"Existe um espaço que une as pessoas de direita e de esquerda, de diversos grupos identitários, e eu busco esse espaço", proclama Manuela Dias.
Receio que essa gente toda vai acabar se encontrando no YouTube ou na Record.