A Livraria Cultura faliu. Nesta sexta-feira, 10 de fevereiro, centenas de consumidores saudosistas cruzaram a loja do Conjunto Nacional para prestar suas últimas homenagens, provavelmente de mãos vazias, já que os preços ali praticados eram (sempre foram) muito altos perto de FNAC e Saraiva, suas antigas concorrentes.
É tentador culpar a digitalização do mercado pela queda da livraria mais simpática de São Paulo. Amazon (e-store) e Kindle realmente atravancaram o caminho da família Hertz, mas não causaram mais estragos ao caixa da companhia que um fenômeno gestado e desenvolvido entre o fim dos anos 1990 e o começo dos anos 2000: a farra das megastores.
A bem-sucedida experiência do Shopping Cultural Ática somada às fases de proteção e expansão de renda do Plano Real criou a algumas redes a ilusão de que era possível erguer a qualquer momento um trambolho recheado de discos, DVDs, eletrônicos e papelaria. Era evidente que a conta uma hora não ia fechar.
A aposta no segmento musical já era arriscada no início dos anos 2000. O surgimento do iPod e dos primeiros celulares com cartões de memória era o prenúncio de uma transformação mercadológica sentida pelas gravadoras. Em paralelo, havia a pirataria física, nunca combatida adequadamente pelo governo brasileiro. Igualmente venenosa era a crença no mercado de filmes e séries. Gravar DVDs era mais fácil que copiar CDs. E os torrents já eram práticos nos primórdios da internet a cabo, quando os Real Players eram a sensação nos PCs.
Deixando cada vez mais de lado o mercado editorial, algumas megastores passaram a expor, especialmente nas janelas virtuais, novas categorias de produtos, como impressoras, computadores premium e smartphones. O problema, aparentemente desprezado no início das operações: os preços eram pouquíssimo competitivos. Eram muitos os espertinhos que experimentavam gadgets na FNAC Pinheiros para comprar, com descontos de até 30%, os mesmos itens na Fast Shop. Houve até quem quisesse, inutilmente, concorrer com a Kalunga em papelaria e materiais de escritório.
A sobreposição de passos maiores que as pernas custaram caro para Saraiva e Cultura --esta última, sabe-se lá a razão, ainda caiu na tentação de adquirir as operações da FNAC, a primeira a notar, ainda em 2014, que o Brasil era insustentável. Preparem-se para o Carrefour Express do Conjunto Nacional.